TNFD: a natureza em foco nos negócios

TNFD

TNFD: A última Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP 15) e a aprovação do Global Biodiversity Framework (GBF) colocaram em foco a crise global da biodiversidade, pautando a urgência de seu reconhecimento e da implementação de estratégias em todo o mundo para reversão desse quadro.

A diminuição da diversidade biológica e a degradação dos ecossistemas colocam em risco a sociedade e os negócios que dependem dos diversos serviços ecossistêmicos oferecidos pela natureza. Diante disso, é crescente a busca por metodologias robustas que sejam capazes de quantificar os impactos das atividades produtivas sobre a biodiversidade, suas dependências e avaliar os riscos e oportunidades associados à natureza.

É notável que as empresas e, especialmente, o mercado financeiro, tem se empenhado no desenvolvimento de frameworks que possam auxiliá-los na compreensão de sua interface com a natureza e do cenário em que estão inseridos.

O que é o TNFD ?

https://www.youtube.com/watch?v=IVVpcylTt7c&t=1s

 

Nesse contexto surge o Taskforce on Nature-related Financial Disclosures (TNFD), iniciativa internacional baseada na ciência capitaneada pelo mercado financeiro (AXA, BNP Paribas, HSBC, Mirova, entre outros) que surgiu como resposta a iminente necessidade de gerenciamento dos riscos e oportunidades associados ao nexo negócios e capital natural.

Após quase dois anos de projeto e desenvolvimento, o arcabouço metodológico se encontra em fase final de desenvolvimento, com publicação das versões beta 0.1, 0.2, 0.3 e 0.4 e previsão de lançamento da versão final para setembro de 2023. Seu objetivo principal é fornecer uma estrutura de gerenciamento e divulgação de riscos para que os interessados possam identificar, avaliar, responder e, quando apropriado, divulgar suas questões relacionadas à natureza, apoiando uma mudança nos fluxos financeiros globais, afastando-os de operações negativas para a natureza e aproximando-os de operações positivas para a natureza.

O framework oferece uma abordagem complementar e totalmente alinhada ao Taskforce on Climate-Related Financial Disclosures (TCFD), relacionado ao clima, e se baseia e se alimenta de padrões internacionalmente reconhecidos, tais como o Global Reporting Initiative (GRI) e o International Sustainability Standards Board (ISSB).

Elementos-chave do Framework TNFD

O quadro metodológico proposto pelo TNFD está centrado em 06 requisitos gerais:

TNDF-QUADRO

Tais requisitos possuem interface com 04 pilares de recomendações associados à 1.Governança, 2.Estratégia, 3.Gerenciamento de riscos e impactos e 4.Métricas e metas.

Abordagem LEAP: Orientando Organizações na Implementação do TNFD

Uma grande diferença existente entre as estruturas propostas pelas Taskforces para o Clima (TCFD) e para a Natureza (TNFD) é que esta última considera a relevância de se conhecer a localização geográfica onde as dependências os impactos estão situados, conforme apontado pelo requisito 4 do TNFD.

Outra especificidade da avaliação de impactos sobre a natureza consiste na consideração de todo o escopo da cadeia de valor (montante, local e jusante) e não apenas dos aspectos locais, alinhado ao requisito 2 acima. Ademais, pode ser apontada a visão norteadora da metodologia pautada na materialidade (requisito 1 do TNFD) do impacto ou da dependência.

Riscos e Oportunidades

Em toda a estrutura do TNFD o termo “questões relacionadas à natureza” refere-se coletivamente aos quatro conceitos centrais do framework: dependências relacionadas à natureza, impactos, riscos e oportunidades, que constituem também o cerne da avaliação LEAP (Locate, Evaluate, Assess, e Prepare, em português, Localizar, Estimar, Avaliar e Preparar), abordagem que atua como uma orientação prática de “como proceder”, para apoiar as empresas e instituições financeiras na formulação de suas estratégias em biodiversidade e reporte.

Pode ser entendido como um processo de avaliação integrado para riscos e oportunidades e inclui quatro fases:

Localizar sua interface com a natureza:

Nesta etapa a organização deve localizar seus ativos e operações diretas (escopo 1), além das atividades que precisam ocorrer dentro das suas cadeias de valor (escopo 3 – montante e jusante). Além disso, nesta fase também é necessário identificar quais são os biomas e ecossistemas que possuem interface com as atividades anteriormente identificadas, e ainda, quais são seus estados de integridade e sua relevância biológica para definição de áreas prioritárias.

Estimar dependências e impactos:

A organização deve identificar em quais dos locais prioritários mapeados na fase anterior são causados impactos à natureza decorrentes dos processos e atividades do negócio. O tamanho e a dimensão desses fatores devem ser quantificados e, para isso, existem ferramentas que podem ser utilizadas, tais como: Corporate Biodiversity Footprint (CBF); Site Biodiversity Footprint (SBF) e Global Biodiversity Footprint (GBS). As dependências da organização em relação à biodiversidade e aos serviços ecossistêmicos também precisa ser estimada e, para tanto, uma das ferramentas mais utilizadas é a ENCORE;

Avaliar riscos e oportunidades relevantes:

Uma vez localizados e quantificados os impactos e as dependências, é possível identificar os riscos e oportunidades associados, considerando-se riscos físicos, de transição e sistêmicos. De posse dos riscos identificados, a empresa deve avaliar internamente quais abordagens de mitigação e gestão de riscos e oportunidades já foram colocadas em práticas e quais ainda devem ser consideradas e implementadas, bem como avaliado quais riscos e oportunidades são relevantes e devem ser divulgados.

Preparar para responder e reportar:

A última etapa da abordagem LEAP leva em consideração a definição de quais decisões estratégicas e de alocação de recursos devem ser tomadas baseadas na análise executada previamente, além da definição de metas e indicadores de monitoramento, o que pode ser a base para a elaboração de Plano Estratégico em Biodiversidade. Seguindo todos esses passos, a empresa pode se preparar para a elaboração do relatório de reporte, seguindo os requisitos mínimos exigidos pelo padrão TNFD, além de outras divulgações relacionadas à natureza.

A abordagem LEAP foi pensada para ser executada em um processo iterativo, incentivando os usuários a considerarem cuidadosamente o escopo da avaliação desde o início. Além disso, ao passar pelas etapas anteriormente citadas, os analistas são incentivados a consultar as partes interessadas mais relevantes para completar todo o processo.  

O TNFD ressalta que todas as empresas e instituições financeiras, em todos os setores e ao longo das cadeias de valor, precisam identificar e avaliar suas questões relacionadas à natureza, independentemente de sua eventual publicização (reporting).

Aplicação do TNFD: Diversidade de Organizações, Objetivos Comuns

No tocante à aplicação do framework, é relevante destacar que este pode ser utilizado por diversos tipos de organização e com diferentes intuitos. As instituições financeiras, por exemplo, podem fazer uso dos relatórios de reporte divulgados pelas empresas para decidir sobre sua estratégia de posicionamento e portfólio de investimentos.

Já as empresas não-financeiras podem fazer uma melhor gestão de suas operações, reduzindo as atividades negativas e potencializando aquelas positivas em relação à biodiversidade, com subsídios para um gerenciamento efetivo dos riscos associados ao capital natural. 

Nesse contexto, é interessante destacar que diversas organizações estão ampliando a sua estratégia climática incluindo o nexo clima-natureza, de forma que ambas as temáticas, intrinsecamente conectadas, sejam abordadas conjuntamente e coordenadamente, sempre que possível.

Desafios e Potencial: A Contribuição do TNFD para a Gestão da Biodiversidade

Por fim, é pertinente destacar que a gestão da natureza é complexa, uma vez que abrange diferentes dimensões, tais como fauna, flora, água doce, oceanos, solo e atmosfera. Além disso, a definição de métricas de referência para mensuração de impacto e dependências ainda se encontra em processo de padronização, apesar da existência de métricas robustas e internacionalmente reconhecidas como a Abundância Média de Espécies – MSA e a Fração de Espécies Potencialmente desaparecidas – PDF.

A existência e disponibilidade de dados ambientais localizados por unidades operacionais e em toda a cadeia de valor também se apresenta como um gargalo, já que há um déficit de corporações que coletam e relatam tais dados de forma tão granular, considerando toda a cadeia produtiva.

Nesse sentido, o framework do TNFD agrega bastante valor ao propor de forma inédita uma metodologia padrão que considere a complexidade do tema, se alinhe às outras principais metodologias existentes e reconheça no seu escopo a necessidade de constantes avanços nas limitações acima mencionadas.

Autoria: Camila Marçal, Déborah Luisa Silva e Leonardo Werneck, I Care

Data: 30/08/2023

Este site utiliza cookies para lhe oferecer uma melhor experiência de navegação. Ao navegar neste site, você concorda com o uso de cookies.