O número de eventos extremos de precipitação na atual estação chuvosa no Brasil foi recorde, aponta o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais.
Somente em dezembro de 2021, foram emitidos 516 alertas de risco de desastres de origem hidrológica, como deslizamentos de terra, inundações e enxurradas. Desse total, 163 concretizaram-se em ocorrências. Os últimos dois anos e, provavelmente, 2022 são anos em que a estação chuvosa tem apresentado mais episódios extremos de chuva, o que aumenta consideravelmente o risco de desastres em áreas vulneráveis do país.
Somente na Bahia, estima-se que mais de 850 mil pessoas foram afetadas pelos temporais que atingiram o estado em dezembro. Em Minas Gerais, as chuvas deixaram mais de 50 mil desalojados e 7 mil desabrigados. Entretanto, ao mesmo tempo em que cidades inteiras nas regiões Norte, Sudeste e parte do Centro-Oeste do país encontravam-se debaixo d´água, a escassez hídrica na região Sul e parte da região Nordeste causava grandes perdas de produção agrícola e riscos ao abastecimento urbano.
Para cada um desses eventos extremos recentes é possível atribuir uma explicação meteorológica. Os extremos de chuva que aconteceram no sul da Bahia, em Minas Gerais, Piauí, Tocantins e Maranhão, além da atual seca na região Sul do país, estão associados ao La Niña, fenômeno climático que provoca uma série de alterações nos padrões de chuva e temperatura globais.
Eventos climáticos extremos no Brasil
No Brasil, o fenômeno causa chuvas mais abundantes no Norte e Nordeste. No Centro-Sul, provoca aumento de temperaturas e seca. Além disso, no verão é comum a atuação de um sistema meteorológico denominado Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS). Esse sistema é marcado pela presença de uma banda de nebulosidade e chuvas com orientação noroeste-sudeste, que normalmente se estende da Amazônia até o Sul/Sudeste do Brasil, contribuindo para grandes volumes de chuva.
Adicionalmente, durante o mês de dezembro de 2021, ocorreu uma rara configuração de três episódios de ZCAS em um curto período, que oscilaram e se mantiveram predominantemente no sul da Bahia, ocasionando os extremos de precipitação fora de época naquela região. Além disso, as ZCAS se associaram a outro sistema meteorológico de baixa pressão (Vórtice Ciclônico de Altos Níveis).
Entretanto, a simultaneidade de eventos extremos opostos e o aumento da frequência deles nos acende um alerta: esse pode ser mais um efeito da crise climática global. Embora a comunidade científica ainda adote uma cautela antes de associar eventos climáticos específicos às mudanças globais do clima, em conjunto, os eventos climáticos de chuva em algumas regiões e secas em outras sugerem a influência do aquecimento global.
Ambos estão potencializados pelo maior aquecimento da atmosfera que, entre outros fatores, afeta a circulação atmosférica. A dinâmica da atmosfera com 419 partes por milhão de CO2 (atualmente) é marcantemente diferente da atmosfera de 280 partes por milhão de CO2 (era pré-industrial). O clima está mais irregular e essa irregularidade amplifica os riscos climáticos, o que aumenta significativamente a chance de desastres de origem hidrológica no Brasil.
Aumento do aquecimento global e suas consequências
Em suma, cada meio grau adicional de aquecimento global causará aumentos estatisticamente significativos nos extremos de temperatura, na intensidade de fortes chuvas e na gravidade de secas. Enfrentar essas ameaças requer uma política de planejamento urbano e redução de vulnerabilidade. Ou seja, o governo e os tomadores de decisão têm um papel crucial para proteger a população do alto risco climático futuro.
Neste sentido, estudos de impactos e vulnerabilidades são fundamentais para orientar conjuntamente os órgãos das três esferas do governo com foco na mitigação dos impactos futuros. A análise de risco climático deve ser um instrumento chave na identificação dos riscos e oportunidades atuais e futuras relacionadas à mudança do clima.
Autores: Argemiro Teixeira e Victor Gonçalves.
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