Por Luísa Becker
Alinhado às Agendas ESG e 2030, as questões específicas relacionadas à Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI) nas empresas e no mercado financeiro têm ganhado destaque no ambiente de negócios, uma vez que o tema vem avançando dentro do mercado de capitais, puxado por órgãos reguladores e autorreguladores de países como Estados Unidos, França, Canadá, Austrália e Chile, por exemplo.
De acordo com estudo desenvolvido pelo Laboratório de Inovação Financeira, alguns dos passos que vêm sendo adotados são: disponibilização de informações sobre diversidade na liderança das empresas; requisição de dados sobre administração e disparidade salarial; e adequação obrigatória do número de mulheres, pessoas pretas e outros grupos minorizados no conselho das empresas de forma gradual.
Sistematizar formas de inclusão que contemplem pessoas de perfis sociais divergentes do padrão branco, masculino, dominante, é fundamental para marcar o comprometimento de uma organização com a diversidade.
Diversidade e o Setor Financeiro
O conceito de diversidade contém múltiplas faces, podendo se referir a gênero, etnia, cor, orientação sexual, etarismo, nacionalidade, religiosidade, histórico educacional, dentre outros recortes. Cabe destacar aqui que é de suma importância a preservação do direito autodeclaratório, uma vez que esses dados são subjetivos, pessoais e sensíveis.
Comportamentos e procedimentos discriminatórios não são observados somente no âmbito pessoal de populações historicamente marginalizadas, isto é, privadas ou limitadas de acesso a oportunidades como educação, trabalho, paridade salarial, entre outros; mas também no ambiente do mercado ou, mais especificamente, no que concerne ao acesso a recursos financeiros e crédito.
Segundo estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID, 2022), levando em consideração os fatores que podem dificultar a implementação da diversidade no mercado financeiro, estando associados às barreiras de acesso a financiamento por parte de empreendedoras mulheres no Brasil, se destacam:
- A falta de informação por parte das instituições financeiras sobre as clientes mulheres, o que levaria a um baixo score de crédito e discriminação estatística, uma vez que empresas lideradas por mulheres ainda são associadas perfis de maior risco;
- A concentração setorial das empresas de propriedade das mulheres no setor de comércio e serviços, segmento com maior dificuldade de acesso ao crédito;
- A menor demanda por crédito por este público, pois há evidências de que as empreendedoras recorrem menos ao setor financeiro quando necessitam de recursos, preferindo valer-se de capital próprio a recorrer a financiamento;
- A conciliação entre trabalho e responsabilidades do lar (que pesa muito mais sobre as mulheres), o que poderia interferir no tempo de dedicação da mulher ao seu negócio, com consequências sobre seu crescimento.
Dessa forma, é possível que ações mais localizadas e focadas nesse perfil de empreendedoras, como uma maior compreensão de suas especificidades, possam contribuir para uma melhor adaptação de seus negócios e desenvolvimento.
Passos rumo à equidade de gênero
Uma das medidas que instituições financeiras podem tomar é a disponibilização de garantias e linhas especiais de crédito cujas condições de prazo, desembolso e pagamento sejam delineadas conforme a natureza do negócio e demanda do mutuário, que podem fortalecer as empresas tomadoras de crédito e, em relação à concedente, mitigar o risco elevado usualmente associado a esses setores (BID, 2022).
Destaca-se aqui a importância do papel das Instituições Financeiras públicas, em especial as de Desenvolvimento (IFDs), pois são, na origem, comprometidas com o desenvolvimento sustentável e inclusivo das regiões onde atuam.
De acordo com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID, 2022), a equidade de gênero vem sendo abordada de duas maneiras: por meio da inclusão nas Políticas de Responsabilidade Socioambiental das IFDs; e por meio da inclusão de linhas de financiamento específicas para as empreendedoras.
Passos rumo à equidade racial
Em relação à diversidade de raça/cor, segundo pesquisa realizada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento em 2017, as pessoas pretas microempreendedoras têm pedidos financeiros de menor montante, menor taxa de liberação dos empréstimos solicitados, menor proporção de valores liberados em relação aos valores solicitados, pagam juros maiores, e têm maior dificuldade de acesso a serviços financeiros em geral.
Entre os problemas identificados estão a falta de conhecimento do perfil dos empreendimentos e negócios destes grupos, o alto número de microempreendedores que não buscam crédito, a maioria por falta de informação ou aversão ao risco, e ausência de dados estatísticos produzidos pelo sistema financeiro sobre grupos específicos da população.
Assim, entre as possíveis políticas que podem ser adotadas pelas instituições financeiras, recomenda-se capacitação e sensibilização de agentes bancários sobre o perfil e potencial de mercado dos negócios voltados para consumidores pretos; e implementação de linhas de microcrédito produtivo focadas nos microempreendedores pardos e pretos.
O papel das finanças verdes
O sistema financeiro está acompanhando o movimento global do mercado, que tem voltado os olhos para a temática ESG nos últimos anos. O financiamento verde é parte deste movimento, pois tem a capacidade de alinhar o mercado de capitais com investimentos em projetos sustentáveis e que visam o desenvolvimento social.
Acreditamos que as medidas para se adequar às Agendas ESG e 2030 devem ser pensadas para além do âmbito mercadológico: colocar pessoas e o meio ambiente à frente é iniciativa indispensável para manter a atividade e a credibilidade de sua empresa. Neste ponto, não há para onde correr. Principalmente, porque cada vez mais se exige um avanço do “S”, de Social, por clientes, stakeholders e provedores de funding.
Assim, diversidade e inclusão financeira de diferentes grupos minorizados no âmbito do mercado, por meio de produtos financeiros direcionados a eles, é uma grande oportunidade para instituições financeiras se anteciparem e acelerarem a diversidade em sua atuação.
Referências:
BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento. Acesso ao crédito produtivo pelos microempreendedores afrodescendentes: Desafios para a inclusão financeira no Brasil. 2017. Disponível em: https://publications.iadb.org/publications/portuguese/document/Acesso-ao-cr%C3%A9dito-produtivo-pelos-microempreendedores-afrodescendentes-Desafios-para-a-inclus%C3%A3o-financeira-no-Brasil-Sum%C3%A1rio-executivo.pdf
BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento. Caracterização das MPMEs brasileiras e os entraves do acesso ao crédito sob a perspectiva de gênero. Notas Técnicas nº IDB-TN-2468. Maio de 2022. Disponível em: https://publications.iadb.org/publications/portuguese/document/Caracterizac%C3%A3o-das-MPMEs-brasileiras-e-os-entraves-do-acesso-ao-credito-sob-a-perspectiva-de-g%C3%AAnero.pdf
LAB – Laboratório de Inovação Financeira. Diversidade no sistema financeiro: aprendizados com a experiência internacional e caminhos para a evolução no ecossistema brasileiro. Rio de Janeiro, fevereiro de 2022. Disponível em: https://labinovacaofinanceira.com/wp-content/uploads/2022/02/LAB-%E2%80%8BDiversidade-no-Sistema-Financeiro-Aprendizados-com-a-experiencia-internacional-e-caminhos-para-a-evolucao-no-ecossistema-brasileiro.pdf
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